
Em tempos imemoriais, vivia na vila, num lindo edifício com duas altaneiras torres, uma esbelta moura de seu nome Marialva, por quem um audaz cavaleiro nazareno se tomou de amores. Correspondido na sua afeição, o enamorado jovem vivia deslumbrado com a sua paixão, até que um dia, por acaso , descobriu que a sua formosa dama possuía pés de cabra. Assombrado pela descoberta de tão satânica característica, publicamente, como era costume na época, grita bem alto a aberração, até então tão bem escondida. Revela o seu amor ilícito e, para desagravo da sua alma, proclama perante o poco assustado: "Marialva tem cara de rosa e chancas de cabra". A jovem agarena, desprezada pelo seu amor e apontada pela população cristã como filha do Demónio, põe termo à vida, atirando-se do cimo de uma das torres do seu palácio.
Conta uma lenda que habitava neste castelo um importante fidalgo de seu nome D. Ramiro Alvar. Apesar de intensa vida social, havia já feito trinta anos sem que descobrisse mulher que lhe aprouvesse para noiva. Certo dia, num solitário passeio a cavalo, encontra uma formosa aldeã por quem sente forte paixão, pedindo-a em casamento. A jovem, de seu nome Rosa, aceita e a boda tem lugar pouco tempo depois, adquirindo a jovem bem depressa os modos e maneiras de nobreza. Contudo, dois anos eram passadis sobre o seu feliz enlace quando a guerra chama o jovem fidalgo que, em plena batalha, salva a vida de um companheiro de luta, D.Gonçalo, a quem permite que se restabeleça em sua própria casa. D. Gonçalo, fidalgo aventureiro, é recebido no castelo de Longroiva a fim de recuperar dos ferimentos de guerra, mas rapidamente se enamora da esposa do seu amigo e salvador, paixão que se torna correspondida. Após o seu restabelecimento faz acreditar à sua anfitriã que o seu esposo perecera em combate, notícia que deixa Risa em profundo luto durante um ano, findo o qual aceita casar com D. Gonçalo que, entretanto, permanece no castelo. Durante o alegre casamento, D. Ramiro regressa ao castelo e de imediato se trava um duelo entre os dois rivais, acabando D. Gonçalo por sucumbir ao braço forte de D. Ramiro. A jovem pede igualmente a morte mas o marido quer perdoar-lhe o ocorrido, facto que Rosa, sentindo-se desonrada, recusa, passando desde então a viver sob uma rigorosa penitência na sua antiga cabana no bosque. Diz a tradição que ainda hoje, quando alguém por este bosque passeia, junto à cabana do remorso se ouve o choro da jovem aldeã.
Conta a célebre história que este jovem e valente guerreiro se encontrava muito incomodado com a inércia dos seus companheiros perante o demorado cerco dos mouros à praça de Trancoso, tendo resolvido agir por conta própria. Desta feita, decidiu sair do castelo pela calada da noite no intuito de se apoderar da bandeira do inimigo, o que conseguiu com alguma temeridade e muita loucura. Refreando a vontade de espezinhar logo ali a bandeira do crescente, João Tição regressou ao castelo levando solto ao vento o símbolo da sua vitória. Os mouros, assim que descobriram o furto, partiram nos seus potentes puros sangues e depressa diminuíram a distância que os separava de João Tição. Este pensando ter as portas a Nascente abertas, para lá se dirige. Porém, as sentinelas, vendo um vulto empunhando a bandeira inimiga, impedem a sua entrada. Ciente do que estava acontecer, João Tição atira a bandeira para o interior das muralhas e grita: "Salta cavalo! Morra o homem, fique a fama!" Brado que se eternizou na memória do povo trancosano.
O verdadeiro patrono do nosso País é esse sapateiro Bandarra....
O futuro de Portugal - que não calculo mas sei - está escrito já, para quem saiba lê-lo, nas trovas do Bandarra ....
O Bandarra, símbolo eterno do que o povo pensa de Portugal
Foi assim que o poeta Fernando Pessoa referenciou Gonçalo Anes, de sua alcunha Bandarra um sapateiro muito nobre que agitou em 1538 o País com as suas profecias. Acabando por se preso em Trancoso e remetido para as casas do despacho da Santa Inquisição, em Lisboa. Foi-lhe proibido responder ou escrever sobre a Sagrada Escritura. Regressou a terras de Trancoso aonde acabou por falecer em 1545, morrendo pobre, sustentado por duas filhas, segundo a tradição, e por uma companhia da qual não existe relatos da sua existência.
Muitas das suas profecias concretizaram-se após a sua morte e, curiosamente enquadram-se e justificam a sua aplicabilidade nos nossos dias!
Sou sapateiro, mas nobre
Com bem pouco cabedal
E tu, triste Portugal
Quanto mais rico, mais pobre
Aquando da sua visita a esta linda Aldeia Histórica de Portugal não deixei de visitar na Igreja de S. Pedro o túmulo do poeta, profeta e sapateiro de Trancoso, uma supultura mandada lavrar, por D. Álvaro de Abranches.
Em dois sítios me achareis,
Por desgraça ou por ventura:
Os ossos na sepultura,
A alma, nestes papéis.
Associação de Desenvolvimento Local Terras da Beira
Quinta do Remudo - Rabaçal963163092